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Brasileiro é finalista de prêmio de melhor professor do mundo

fev 24, 2017
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Jovem de 26 anos desenvolveu projeto no Rio Doce, após tragédia em Mariana, e revolucionou comunidades pobres no interior do Espírito Santo.

Agricultores pobres com prole numerosa, no interior do Espírito Santo, os pais do menino Wemerson ofereciam aos filhos ainda pequenos duas opções: ir para roça com eles, capinar lavouras e colher café, ou estudar. Franzino e com mãos de pele fina que o cabo da enxada enchia de bolhas, o menino sempre optava pelos livros. Nesta quarta-feira, 22, o hoje professor Wemerson Nogueira da Silva, de 26 anos, será apresentado como o único brasileiro entre os dez finalistas ao prêmio de Professor Global 2017, que dará ao vencedor US$ 1 milhão.

Professor de ciências da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Antônio dos Santos Neves, na pequena Boa Esperança, cidade de 15,3 mil habitantes na região noroeste do Estado, Wemerson está concorrendo com educadores de países como Inglaterra, Alemanha, Espanha e Austrália. Em sua terceira edição, o Professor Global (Varkey Foundation Global Teacher Prize 2017), é o maior prêmio do gênero e foi criado para reconhecer “um professor excepcional que tenha feito uma grande contribuição para a profissão, além de chamar a atenção para o importante papel que os professores exercem na sociedade”.

Entre 2012 e 2014, o professor capixaba revolucionou as comunidades pobres de Nova Venécia, sua terra natal, com o projeto ‘Jovens Cientistas’, como conta. “A comunidade é carente de tudo e muitos alunos faziam o tráfico de drogas nos arredores e nas dependências da escola. Comecei a motivá-los para a música, para o esporte e, por fim, envolvi os pais. Os alunos passaram a ter interesse pela escola e pelo contexto social.” Ele conta que num dos projetos, o ‘Karaoquímica’, os alunos cantavam as fórmulas de uma matéria normalmente difícil. Contrariando orientação dos chamados “pedagogos”, ele liberou o celular nas aulas e converteu os aparelhos em fonte de consulta.

Depois de detectar que muitos alunos sofriam violência em casa, focou o tema em pesquisas e trabalhos escolares. “Em dois anos, a violência doméstica nessa região caiu 80% e a criminalidade relacionada à droga reduziu 90%.” Outro projeto, chamado “Filtrando as Lágrimas do Rio Doce”, saiu da escola e foi para as margens do rio, castigado pelos resíduos de mineração após o rompimento da barragem de Mariana (MG). Além de constatar in loco os efeitos da poluição, os alunos orientados por ele, e com a ajuda de especialistas, desenvolveram sistemas para tratar a água e devolver a potabilidade. “Distribuímos os filtros para a comunidade ribeirinha e os moradores puderam ter de volta água limpa em casa.” Os trabalhos já renderam a Silva o prêmio brasileiro de Educador Nota 10, o Educador do Ano, em 2016, da Fundação Victor Civita.

A forma diferenciada de lecionar deu bons frutos, segundo ele. “Muitos desses alunos conseguiram entrar no Instituto Federal do Espírito Santo, uma escola concorrida. Eles disseram que nunca tinham sonhado com isso. No ano passado, um aluno meu foi aprovado para o curso de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo. Pena que, de tão pobre, ele não tinha dinheiro para se manter e não pôde dar continuidade, mas tenho certeza de que não vai desistir.”

Wemerson sabe por experiência própria que o incentivo é tudo quando se trata de aprender. “Sou de origem humilde, meus pais até hoje vivem do salário de aposentado rural, mas sempre deram prioridade para o estudo. Somos sete irmãos e sou o único professor, mas todos estudaram. Tenho uma irmã formada em advocacia, outra em radiologia e outra na área social. Todos nós estudamos em escolas públicas, com muita dificuldade. Quando eu tinha 14 anos, vendia picolé na rua e guardava o dinheiro, pois sonhava fazer faculdade.”

Ele conta que conseguiu, na época, fazer uma poupança de R$ 700 vendendo sorvete de palito. “Não consegui passar na federal, então decidi fazer um curso a distância. Isso mesmo, sou formado num EAD (Ensino a Distância). Muitas pessoas torcem o nariz, mas foi o que consegui fazer. Com minhas economias, eu pagava R$ 190 de mensalidade.” Com apenas quatro meses de curso, ele se apresentou em uma escola que enfrentava falta de professores e começou a substituir os faltosos nas aulas. “O dinheiro da substituição me ajudou a terminar o curso de Ciências Biológicas.”

Caso vença o Professor Global 2017, o brasileiro já sabe o que fará com o dinheiro. “A prioridade é construir um laboratório de Ciência e Tecnologia na minha cidade, aberta a todos. Sei da importância porque minha escola não tinha um microscópio para mostrar uma célula para os alunos.” Outra parte do dinheiro vai para uma instituição que incentive a formação de professores e, se sobrar, Wemerson usará o restante em sua própria formação. “Sonho em conhecer a realidade da educação em outros países, os mais avançados, como a Finlândia, e outros mais carentes. Isso pode me ajudar no trabalho no Brasil.”

O prêmio é concedido pela Varkey Foundation, com sede em Londres. Os dez finalistas foram selecionados entre 20 mil indicações e inscrições de 179 países. O vencedor será anunciado no Fórum Global de Educação e Habilidades em Dubai, no domingo, 19 de março de 2017. No anúncio dos dez finalistas, o Príncipe Harry fez uma homenagem ao trabalho dos professores. “Além de ensinar a ler, escrever e aritmética, os melhores professores vão além das páginas dos livros para ensinar aos jovens sobre determinação, ambição, resiliência e compaixão. Todos enfrentamos obstáculos e desafios em nossas vidas e nossos professores exercem um papel crucial para nos preparar para esses altos e baixos.”

O fundador da Varkey Foundation, Sunny Varkey, parabenizou Wemerson por estar entre os dez finalistas. “Espero que sua história inspire as pessoas que estão pensando em seguir a carreira de professor e que também chame a devida atenção para o incrível trabalho que os professores fazem por todo o país e no mundo inteiro, todos os dias.” O brasileiro já se considera um vencedor. “Essa caminhada que estou vivendo já há alguns anos com meus alunos é o meu melhor prêmio.”

Fonte: Estadão

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