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Mais do que simples tendência, a corrida é, para muitos, uma terapia

jun 2, 2015 #bem estar, #corrida, #maratona
25/05/2015. Credito: Leandro Couri/EM/D.A Press. Brasil. Belo Horizonte - MG. Elissama de Assis, jornalista, venceu a obesidade e a depressao, consequente da morte tragica do pai, atraves da corrida. No mes passado, ela correu a maratona de Paris.
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Prática é uma forma de superar dores físicas e emocionais, além de manter a forma

A corrida de rua virou moda. A cada esquina, todos os dias, esbarramos com grupos de pessoas ou corredores solitários desbravando a cidade. Mais do que uma simples tendência fitness, no entanto, a prática do esporte virou uma filosofia de vida. Especialmente para quem passou por problemas graves de saúde ou foi submetido a um trauma familiar. Para muita gente, correr pelas ruas da capital mineira tem sido uma terapia, um auxílio na superação desses infortúnios.

A jornalista Elissama Assis Freitas, de 36 anos, é uma dessas pessoas. Depois de combater a obesidade e superar a morte trágica do pai, ela virou maratonista. Em 12 de abril, dois anos depois de começar a correr, a mineira disputou a 39ª edição da Maratona de Paris. Precisou de quatro horas, quarenta e cinco minutos e trinta segundos para completar os 42 quilômetros da famosa prova da capital francesa e chegar entre os primeiros 30 mil participantes – dos 54 mil inscritos no circuito da Cidade Luz, 40.172 completaram a corrida. “Quis provar para mim mesma que era capaz de superar as dores físicas e emocionais que os problemas da vida causam”, justifica.

A escolha de Paris teve um significado especial para Elissama. A prova ocorreu cinco dias depois do aniversário de dois anos da traumática morte do pai. “Queria correr em um lugar frio, estrear em um lugar bacana e que fosse na época do aniversário de morte do meu pai. Como já conhecia Paris, fui mais focada na maratona. Turismo, fiz depois.”

Mas, até chegar lá, a jornalista percorreu um longo caminho. Desde criança, ela lutava contra a balança. Fez todos os tipos de tratamentos para emagrecer, da dieta da lua à ingestão de remédios proibidos. “Isso me incomodou a vida inteira. Sempre fui uma criança e adolescente cheinha. Fiz dietas malucas durante toda a vida, da minha cabeça, nunca procurei especialistas. A obesidade veio depois da gravidez. Fiz dieta da lua, do tipo sanguíneo, sem carboidrato, da sopa. Já tomei remédio bomba e quase perdi amigos e o marido, e olha que ele é bem paciente! Mas eu ficava uma pilha. Uma vez, comprei um remédio de ummédico dentro de um salão de beleza. Nada deu certo, sempre engordava o dobro depois.”

Do casamento, em 2003, e o nascimento do filho, Victor, no ano seguinte, até 2012, Elissama, que mede 1,56m de altura, chegou aos 90 quilos. Atualmente, pesa 50 quilos. “Certa vez, fui para Portugal e, quando vi as fotos, me assustei. Não estava me reconhecendo e isso me incomodou imensamente. Cada vez que me olhava no espelho, me sentia incomodada. Ainda não tinha afetado a minha saúde, mas, do jeito que caminhava a coisa, não demoraria. Daí, comecei a fazer reeducação alimentar por minha conta, sozinha. Tinha o exemplo da minha mãe em casa, que sempre teve uma alimentação saudável e se manteve assim a vida toda. Então, mirei no exemplo dela, de que, se abrir a boca, engorda. Passei a comer regrado. Fui emagrecendo naturalmente e criando motivação a partir do momento em que comecei a me achar mais bonita”, conta.

A cabeleireira Maria Imaculada Gomes, de 52 anos, comemora a participação na Meia-maratona de Amsterdã

VÍCIO PRA VIDA TODA
  Elissama preferiu emagrecer antes de entrar para uma academia e começar a correr. “Tentei entrar para a academia gorda, mas me sentia mal porque estava gorda. Era um contrassenso. Daí, resolvi ir para a academia quando estivesse magra, e foi lá que encontrei motivação para correr. Fazia musculação e caminhada na esteira. Meu professor me incentivou e comecei a trotar, e, quando vi, já estava correndo. Na realidade, emagreci muito antes da corrida, que veio praticamente do nada. Amei e continuo focada. Primeiro, porque procurava algo que me estimulasse a nunca mais ficar parada e voltar a engordar. Como tem provas, desafios… fui me apaixonando, viciando mesmo. Claro que ela ajuda a secar mais e também me dá a liberdade de comer mais aos fins de semana. Depois, ela vicia, porque é uma terapia, onde me perco, me encontro, converso sozinha, lembro do meu pai… Hoje, sou dependente mesmo.”

Atualmente, além da Maratona de Paris, a jornalista tem no currículo de corredora duas voltas da Pampulha e duas meias-maratonas, de São Paulo e Belo Horizonte. Ela treina quatro vezes por semana, incluindo o sábado, e reveza com musculação. Faz acompanhamento com nutricionaista esportivo e fisioterapia para prevenir lesões. Tudo isso comprova que não há mais limites para Elissama. “Agora, quero fazer uma maratona por ano!”

Correr já fazia parte da rotina de Maria Imaculada Gomes de Souza Oliveira, de 52 anos. Em busca de melhor qualidade de vida, em 2008, a cabeleireira entrou para o Clube de Corrida de Rua de Itabirito, onde mora. Mas foi no fim do ano seguinte que o esporte passou a ter significado diferente para ela. Em novembro de 2009, foi dignosticada com um câncer agressivo no intestino. Precisou se submeter a uma intervenção cirúrgica para a retirada do tumor e outras tantas sessões de quimioterapia. Nem assim abandonou o esporte. Correu no Rio de Janeiro em pleno tratamento e, curada, foi comemorar, em grande estilo, na Meia-maratona de Amsterdã, na Holanda.

Para Maria, a corrida era uma forma de esquecer a doença e ganhar forças para seguir adiante. “Em setembro de 2009, comecei a fazer uns exames, pois não tinha paladar e tinha emagrecido muito. Achava que isso era consequência da corrida. Fiz vários exames e nada. Até que a colonoscopia apontou um tumor no intestino, de aproximadamente três centímetros. Fiquei pensando muito nos meus sonhos como corredora, o que seria deles. Em novembro, foi confirmado o câncer. Operei em 18 de dezembro daquele ano ainda. Fiquei muito triste, mas toquei a vida.”

Em março de 2010, sem ter ainda retomado a vida de atleta, Maria iniciou a quimioterapia. “Infelizmente, no resultado da biópsia, um dos pólipos retirados acusou câncer. Comecei a químio em 10 de março, dia de aniversário de morte do meu pai. Foram 26 sessões. Não deixei de trabalhar, continuei na ativa. Saía do meu salão às 12h, todas as quartas-feiras, para fazer o tratamento em Belo Horizonte. Marcava sempre a mesma cliente às quintas-feiras, pela manhã, para ter a obrigação de levantar da cama para o corpo não amolecer. Era a Inês, hoje minha parceira inseparável de corridas.”

Na primeira consulta pós-cirurgia, Maria perguntou ao médico se poderia voltar a correr. “A resposta foi bem clara: ‘Tudo o que você aguentar, você pode. Só peço para não carregar pesos acima de sete quilos, pois pode adquirir uma hérnia’, ele disse. No outro dia, comecei a caminhar, já pensando em correr. Foi em fevereiro de 2010. Num domingo, saí de casa para correr. Meu marido pediu para não ir, mas eu disse que o médico tinha deixado. Minha intenção era caminhar três minutos e correr 10, mas não aguentei. Corri um minuto e caminhei 10. Correr era muito difícil, mas eu morria de rir da pretensão, da ideia de que tinha de sair correndo daquela situação que, no fundo, era bem engraçada.”

Maria Imaculada (E) conseguiu convencer a cliente e amiga Inês a correr e a participar de competições

Em março, decidiu correr o Desafio Runner’s, no Rio de Janeiro. Aceita pela organização do evento, lá se foi ela. “Fiquei feliz demais. Ia voltar a correr, teria um ótimo acompanhamento e ainda ia fazer uma prova no Rio. Quanta emoção! Tinha muita dificuldade para me alimentar. Não tinha apetite. Normalmente, comia mingau de aveia feito pelas minhas filhas, algumas frutas e muito Gatorade. Isso dificultava muito os treinos, mas fui levando da forma que dava. Fazia o que dava conta e ficava muito feliz ao ver minha evolução. A corrida ocupava todo o espaço que tinha disponível naquele momento. Comecei a correr atrás da minha saúde. Fazia academia duas vezes por semana e corria outras três.”

PAUSA OBRIGATÓRIA
Depois do Desafio Runner’s, porém, Maria teve de ser internada. O esforço grande, somado à forte emoção e à longa viagem, provocou a internação. “Mas nada se compara à emoção que senti ao cruzar a linha de chegada na Cidade Maravilhosa, e ver o meu marido, que achava tudo aquilo uma loucura, segurando uma plaquinha que dizia: ‘você conseguiu!’”, conta.

Maria foi obrigada a parar de correr por dois meses, a pedido do médico. Estava muito magra. “Mas voltei em novembro, cheia de objetivos e sonhos! Hoje, já corri algumas provas de 21 quilômetros, planejo fazer uma maratona e sou completamente feliz. Vou na minha passada lenta, mas cheia de amor.”

De lá para cá, ela disparou. Para comemorar a cura e seus 50 anos, há dois anos, Maria disputou a Meia-maratona de Amsterdã. E aquela cliente das quintas-feiras, que virou amiga inseparável, estava lá para compartilhar da alegria da conquista. E as irmãs da cabeleireira, que não aprovavam o esforço, viraram corredoras, ironicamente, inspiradas pela história de Maria. Os filhos dela também. Só o marido que continua sem entender toda a loucura da mulher. “Tentar, ele até tentou, mas não se apaixonou. Preferiu ser apenas o meu apoiador”, finaliza.

Maratona depois dos 50
Maratonista há 20 anos, o médico Dráuzio Varella lançou, dia 25, o livro Correr, pela Companhia das Letras, sua 13ª publicação. Desde que começou, correu uma maratona por ano e já acumula 20 no currículo, incluindo oito edições da Maratona de Nova York e duas de Boston, uma das mais tradicionais do planeta. No novo livro, o médico, um ex-fumante, conta como descobriu o prazer da maratona aos 50 anos, 13 anos depois de ter parado de fumar. Correr é dividido em cinco partes: os primeiros passos, a história da maratona, as grandes provas de Dráuzio, outras corridas pelo mundo e alguns percursos feitos em São Paulo. Em cada bloco, o texto ganha tom mais sério para abordar questões de saúde e qualidade de vida. Aos 72 anos, ele está com o pé esquerdo lesionado e impossibilitado de correr. Nesses dias sem atividade física, ele confessa que, sem a corrida, fico fisicamente pior. Fico achando que meu corpo não está legal e também me dá um pouco de agitação”, diz.

Encontro delas
Mais uma edição da tradicional corrida para mulheres, a Encontro Delas, uma realização da revista Encontro, dos Diários Associados e do Estado de Minas, ocorre hoje. A largada será às 9h, para o percurso de seis quilômetros da Lagoa Seca, no Belvedere, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Haverá também várias atividades físicas, na arena montada no local, monitoradas a partir das 7h30. As participantes serão divididas em seis categorias: elite, onde competirão as atletas profissionais; atletas de 25 a 34 anos; de 35 a 44 anos; de 45 a 54 anos; e acima de 55 anos. As três primeiras colocadas de cada categoria serão premiadas com troféus.

Tudo dentro das limitações
A busca por melhor qualidade de vida e por algo que dê prazer é uma das principais motivações que levam as pessoas a se aventurar pelas ruas da capital

Fernando César dos Santos passou de 120 quilos para 80 quilos e transformou sua história no livro As memórias de um ex-abóbora

Depois de uma temporada de férias no litoral brasileiro repleta de excessos, em 2009, o advogado Carlos Vinícius Rigotto, de 50 anos, foi obrigado a mudar completamente o estilo de vida. Obeso clássico, como ele mesmo se declara – pesava 140 quilos –, estava com índice glicêmico em 560 quando chegou ao pronto-atendimento de um hospital, em Belo Horizonte, passando muito mal. Era um pré-coma diabético. Além disso, estava hipertenso e sob o risco de infartar. O quadro grave foi um choque de realidade para o advogado, que virou corredor de rua, emagreceu 60 quilos e trocou o manequim 56 pelo 40.

“Aos 44 anos, era o presidente da Confederação Brasileira de Sedentários, fumava três maços de cigarro por dia, isso quando não estava bebendo, porque, quando estava, o céu era o limite para mim, e pesava 140 quilos. No hospital, o endocrinologista disse que, se eu mantivesse aquele estilo de vida, ele me amputaria um pé, eu ficaria cego e o meu desempenho sexual ficaria comprometido. Saí de lá desesperado, preocupadíssimo com minha saúde. Procurei uma academia e fui fazer dieta. Minha treinadora na academia viu que eu tinha predileção por atividades aeróbicas e me convidou para uma corrida noturna na Pampulha. Daí, não parei mais.”

O processo de emagrecimento foi lento, segundo Carlos. “Gordo, você já viu, né, quando perde muito, perde 15 gramas, e, quando come uma empadinha, engorda meio quilo. Não tem jeito. Mas não desanimei. Treinei para fazer a minha primeira prova ainda gordo e completei uma de cinco quilômetros em 31 minutos. Achei uma delícia. Saí de lá me sentindo o Robson Caetano. Daí, resolvi correr com a orientação de uma assessoria profissional e consegui tirar 12 sacos de arroz das minhas costas”, brinca o advogado, referindo-se aos 60 quilos perdidos até agora.

Com índice glicêmico atual na marca de 80 e pressão normal (12/8), Carlos afirma que a corrida virou sua cachaça. “Meu maior adversário agora sou eu mesmo. Quero ganhar prazer e qualidade de vida. Se tiver de correr preocupado em diminuir ou ganhar tempo, não tem o menor sentido. Aos 50 anos, não tenho a menor pretensão de ser atleta”, afirma o advogado, que já competiu em três meias-maratonas do Rio de Janeiro e em todas as voltas da Pampulha desde 2009.

 

Fisiologista do Atlético, Roberto Chiari lembra que o corredor amador deve começar devagar para evitar lesões

A história de Carlos é parecida com a do produtor de eventos Fernando César dos Santos, de 45. “A corrida foi 100% fundamental no processo da minha perda de peso. Tinha 120 quilos quando comecei a treinar. Primeiro, comecei a andar e a perder peso a partir daí. Cheguei mais leve à academia e minha personal começou a me levar para a Pampulha para treinar. Fui aumetando minha distância progressivamente.”

Quando os resultados foram aparecendo, Fernando ganhou mais motivação. “Lembro-me de quando fiz meus primeiros três quilômetros sem intervalo. Foi minha primeira vitória. A coisa começou a ter resultado e passei a treinar para dar a volta na lagoa. A intenção era fazer a Volta da Pampulha em dezembro, mas, em setembro, fui fazer um teste de 14 quilômetros e consegui completar os 18 quilômetros de extensão.”

O produtor, que teve problemas na cartilagem do joelho, tornozelo e pés por causa da obesidade, pesa atualmente 80 quilos. Ele afirma que a corrida passou a ser uma terapia. “Meu objetivo é sempre chegar ao fim do percurso inteiro e sem pressão. Corro em busca de algo que me satisfaça, em busca de uma vida saudável, não corro para diminuir meu tempo.” A história de Fernando virou livro. Ele conta toda a sua trajetória na publicação As memórias de um ex-abóbora – a verdadeira dieta começa na sua cabeça.

O advogado Carlos Rigotto (D) treina na Pampulha sob supervisão do educador físico Paulo Henrique dos Santos

A busca por melhor qualidade de vida é uma das principais motivações que levam as pessoas a se aventurar pelas ruas da capital, segundo o educador físico e diretor da equipe Run & Fun, Paulo Henrique dos Santos. Ele atenta, porém, para a necessidade de uma orientação especializada. “A nossa linha é preservar essa qualidade. Agora, os objetivos são pessoais. Atendemos pessoas sedentárias, que nunca fizeram nada na vida, e que estão hipertensas e diabéticas. Outras querem apenas treinar. Por isso, é necessário um acompanhamento especializado, porque cada pessoa tem um objetivo e o seu limite.”

Fisiologista do Clube Atlético Mineiro e colaborador do Instituto Mineiro de Obesidade e Cirurgia, Roberto Chiari atenta para os cuidados que o corredor amador deve ter. Segundo o profissional, inicialmente, a corrida de rua é uma atividade possível para todas as pessoas, mas elas precisam conhecer suas limitações. “Para a pessoa obesa, por exemplo, a corrida pode ajudar no processo de emagrecimento. Ela não tem de, necessariamente, correr no início. Pode caminhar em ritmo mais forte, por exemplo, combinando com dieta equilibrada. Depois, consegue evoluir para a corrida. Ela precisa entender que o processo tem de ser o mais natural possível, para evitar qualquer tipo de lesão ortopédica que possa comprometer o seu esporte.”

Fonte: http://sites.correioweb.com.br/

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